História, histórias e curiosidades
A noção mais difundida e genericamente aceite é de que os ingleses procuraram a Camacha para fugir ao calor do Verão no Funchal. Efectivamente e com base nos diversos testemunhos escritos que se podem encontrar com relativa facilidade, assim terá sucedido maioritariamente. O testemunho que se transcreve abaixo[i] deixa antever outra realidade e fornece mais algumas pequenas peças do puzzle da história desta localidade: Recordações da Madeira durante o Inverno de 1844-45 “Mas nunca me esquecerei da minha primeira cavalgada até à Camacha, uma pequena aldeia a cerca de sete milhas do Funchal, lugar de duas ou três quintas inglesas. Depois de cavalgar por uma hora sobre o áspero pavimento da Madeira, descendo e subindo várias ravinas, contorcendo-me, virando e serpenteando entre belas colinas, cujos lados eram, então, uma massa de tojo amarelo, tendo atingido uma elevação de cerca de três mil pés, cheguei a uma estrada suave e macia que corre ao longo de um planalto, com terreno ondulado e selvagem em ambos os lados. Galopei alegremente, com a pequena aldeia diante de mim. O ar revigorante, tão diferente do clima enervante do Funchal, fresco, mas não frio e tão leve e doce. A atmosfera clara e brilhante, sem uma nuvem tingindo o céu, que, de um azul profundo, parecia incomum e magnificamente distante. A suavidade da estrada, o cenário aberto, as pequenas casas e a torre da igreja, empoleiradas, entre as árvores ao longe, era tudo muito inglês. O dia era inglês, fresco e outonal e os meus pensamentos, naquele momento, estavam nas coisas inglesas e em casa. A ilusão logo se dissipou, pois, virando por engano para a direita e fazendo uma ligeira subida da aldeia, encontrei-me num pedaço de relva macia e plana que parecia ser delimitada por uma descida íngreme. Galopei até a borda, e a Madeira, na sua característica glória, estava novamente diante de mim. Uma terra nobre estendia-se entre mim e a costa, quebrada e convulsionada num cenário soberbo. Rochas, vales e arvoredo, exibindo todas as variedades de cores sob o sol radiante e pitorescas cristas cinzentas que se erguiam aqui e ali, lançando sombras ousadas sobre a encosta da montanha. Em locais como estes os mercadores ingleses estabelecem pequenas e confortáveis quintas, rodeadas por belas plantações de castanheiros e abetos. Sendo a localização tão encantadora, a surpresa para mim sempre foi que as pessoas a trocassem pelas ruas fechadas e abafadas do Funchal. Claro, o clima (especialmente no Inverno) é, devido à elevação, extremamente variável, mas o que é isso para um inglês? Apesar das pesadas nuvens e nevoeiros que por vezes envolvem a localidade, apesar dos furacões que às vezes varrem as colinas, eu diria que o Inverno é a época ideal para desfrutar destes lugares: com o frequente céu sem nuvens e a atmosfera fresca do lado de fora, e uma lareira brilhante e bom ânimo dentro de casa. O hospitaleiro Sr. Bean, da Camacha, em cuja bonita quinta há sempre uma boxe para o seu cavalo e onde a sua lareira arde vivamente na época do Natal, é dos poucos que residem, mais ou menos, durante todo o ano na aldeia. A chama alegre na casa deste, verdadeiro, descendente da Velha Inglaterra, faz sempre bem ao coração de muitos homens, depois de uma longa cavalgada pelas colinas. Assim entre a casa de negócios e a quinta, entre o Funchal e a Camacha, Santo da Serra, Monte ou onde quer que seja que o mercador madeirense passa o seu tempo sem grande mudança, é, talvez, a mais agradável existência de monotonia que já pude observar” “RECOLLECTIONS OF MADEIRA DURING THE WINTER OF 1844-5 But I shall never forget my first ride to Camàcha, a small village, about seven miles from Funchal, and the locale of two or three English quintas. After an hour's riding over the rough Madeira pave, descending and ascending various ravines, twisting, turning, and winding through beautiful hills, the sides of which were then one mass of yellow furze, having reached an elevation of some three thousand feet, I came upon a smooth soft road running along a tract of table-land with wild undulating ground on either hand. I cantered gaily along, with the little village before me. The bracing air, so different from the enervating climate of Funchal,– fresh, but not cold, and so buoyant and sweet; the clear bright atmosphere, not a cloud tinging the sky, which, of a deep blue, looked unusually and magnificently distant; the smoothness of the road; the open down-like scenery, and the little cottages and church-spire perched among the trees in the distance, were all quite English. The day was English, fresh and autumnal; and my thoughts at that moment were of English things and home. The illusion was soon dispelled; for turning by mistake to the right, and making a slight ascent from the village, I found myself on a soft level piece of turf which appeared to be bounded by a precipitous descent. I cantered to the edge, and Madeira, in its characteristic glory, was again before me. A noble country stretched between me and the coast, broken and convulsed into superb scenery. Rock, glen, and wood, exhibiting every variety of colour under the gladdening sunshine: and quaint grey ridges that rose here and there, casting bold shadows over the mountain side. In such spots as these also do the English merchants lay out snug little quintas, surrounded by beautiful plantations of chesnut and fir. The situation being so charming, the surprise to me always was, that people should ever exchange it for the close, muggy streets of Funchal. Of course, the climate (in winter especially) is, on account of the elevation, an exceedingly changeable one; but what of that to an Englishman? In spite of the heavy clouds and fogs which sometimes envelope the country; in spite of the hurricanes that sometimes sweep over the hills; I should say winter was the time to enjoy such places– with the frequent unclouded sky and fresh atmosphere without, and a bright hearth and good cheer within. Hospitable Mr B_, of Camàcha, at whose pretty quinta there is always a stall for your horse, and whose bright fire burns bravely at Christmas time, is among the few who reside more or less all the year round in the country. The cheerful blaze at the house of this true scion of Old England has done many a man's heart good after a long ride across the hills. Thus between counting house and quinta between Funchal and Camàcha, the Serra the Mount, or wherever else it may be the Madeira merchant passes his time, and without any great change. It is, perhaps, the most pleasant existence of monotony that ever came under my observation.[ii]” Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com)
0 Comments
Leave a Reply. |
Autores Somos vários a explorar estes temas e por aqui iremos partilhar o fruto das nossas pesquisas. O que já falámos antes:
Abril 2024
Categories |