História, histórias e curiosidades
O mês de Janeiro é o mês do frio. A lembrar que a Festa terminou, as temperaturas outonais que, habitualmente, se vivenciam no período natalício, baixam drasticamente levando-nos a procurar o aconchego do lar. Esta será, eventualmente, a principal razão por que a festa de S. Antão nunca terá alcançado o fulgor de outros arraiais camacheiros. Como tantas outras coisas, a voz popular diz que esta festa é tradição antiga, o quão antiga é que não se torna fácil descortinar. A devoção a este Santo remonta aos tempos do povoamento e crê-se terem sido os primeiros colonos a trazê-la para a Madeira. Conquanto o seu dia seja dezassete de Janeiro, data da sua morte, na Camacha, tanto quanto se sabe, foi sempre festejado no último domingo do mês de Janeiro, provavelmente para não coincidir com os festejos em outras freguesias, nomeadamente no Seixal onde é padroeiro e a festa é mais expressiva. Em vinte e três de Janeiro de 1878 o Diário de Notícias[i], numa pequena nota, anunciava a realização, no dia vinte e sete, da Festa de S. Antão. Informava também de que haveria arraial e que o sermão estava a cargo do reverendo vigário Machado, sendo esta a referência mais antiga encontrada até ao momento. Na mesma fonte, nos anos seguintes e até os finais da década de vinte do século passado, vão-se encontrando pequenas notícias anunciando a sua realização e destacando a presença de diferentes filarmónicas no arraial: Santacruzense, Artístico Madeirense, Recreio Artístico Funchalense, Artistas Funchalenses e Recreio Camponês. É curiosa também a alusão ao coro e “orquestra grande instrumental”, regida por Cesar A. Rodrigues do Nascimento, que abrilhantou a cerimónia religiosa em 1918. Sendo uma festa menor, épocas houve que deixou de ser celebrada. Foi recuperada em 1998 por Maria Augusta Correia de Nóbrega, Oficial da Ordem de Instrução Pública que dedicou importante parte da sua vida à conservação e recuperação das tradições e da cultura popular. Por seu legado, desde então foi sendo celebrada por iniciativa do Grupo Romarias e Tradições, do qual foi fundadora. Nesse âmbito a Associação Grupo Romarias e Tradições assumiu financeiramente, não só a realização da festa como também o restauro da imagem do santo (a qual presume-se ser do século XIX) e execução do seu pendão. Nos últimos anos a paróquia chamou a si a iniciativa. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] Arquivo Regional e Biblioteca Pública da Madeira, Colecção de Jornais
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Durante muitos anos foram uma peça fundamental na estrutura de comercialização do ganha-pão de muitas famílias camacheiras, no entanto poucas referências se encontram sobre essas fortes mulheres camacheiras que diariamente se deslocavam a pé ao Funchal, para entregar os diversos artefactos produzidos pelos artesãos. Ellen M Taylor, uma visitante inglesa que em 1882 escreveu Madeira its Scenery, and how to see it, insere na sua descrição da Camacha uma pequena alusão a esta profissão sem, contudo, fazer qualquer apreciação: “This is quite a village of wicker chair and basket makers they work at their cottage doors and we overtook many women carrying piles of chairs and little tea tables into Funchal” (Esta é uma aldeia, basicamente, de cadeiras de vime e cesteiros que trabalham à porta das suas casas e ultrapassámos muitas mulheres a carregar pilhas de cadeiras e mesinhas de chá para o Funchal) Noutra publicação da mesma autora, desta feita na revista inglesa Good Words[i], em 1888 vimos encontrar uma nova referência que nos apresenta uma imagem um pouco mais aprofundada das nossas carreteiras: “Passing through with rapid steps are some strong peasant girls with loads of wicker work chairs and tables on their heads looking fresh and active even after their walk of seven miles from Camacha the mountain village where this industry gives employment to many.” (A passar, em passos rápidos, vão algumas fortes camponesas, carregando muitas cadeiras e mesas de vime à cabeça, parecendo frescas e activas, mesmo depois da sua caminhada de sete milhas da Camacha, a aldeia serrana onde esta indústria emprega muita gente.) No início do século vinte, a terminar a primeira década Lilian Fairbrother Ramsey alude à sua existência no seu conto Amores Perfeitos , testemunhando dessa forma a continuidade desta profissão nessa época. Em 1934 a revista The National Geographic Magazine faz-lhes também referência, admirando a sua força e perícia. Dois anos mais tarde, em 1936, a inauguração da nova estrada de ligação ao Funchal terá ditado o fim desta profissão que, muito provavelmente, foi desaparecendo com o surgimento de outras formas de transporte de mercadorias. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] https://books.google.pt
No Verão de 1892 apareceu na Madeira uma doença que vitimava cães e por mordedura destes terão sidos infectadas e falecido algumas pessoas. Suspeitou-se de raiva, mas os clínicos madeirenses ficaram divididos, atribuindo causas divergentes aos casos com que lidaram. Assim que se estabeleceu a relação entre a mordedura dos cães e a doença fatal de algumas crianças, a população ficou em estado de alerta, a imprensa regional dedicou bastante atenção ao assunto e o governador civil do distrito, engenheiro Luís Merens de Távora, pediu apoio ao governo nacional, o qual enviou o director do Laboratório de Bacteriologia, o veterinário António Roque da Silveira, encarregado de estudar a doença e de indicar o meio de a extinguir. Tendo chegado à ilha no início de Outubro, logo procedeu a diversos estudos de diferentes casos, tendo chegado à conclusão que, de facto, decorria na Madeira um surto de raiva afectando, para além de cães e pessoas, também gatos e a raça caprina. Na sequência desse diagnóstico apresentou um conjunto de medidas que, com elevada colaboração da população e da imprensa, resultaram na completa erradicação da doença, tendo sido considerada extinta em Dezembro de 1893. Apesar de não ser referida nos casos oficiais, a Camacha terá tido também a sua quota de casos. O Diário de Notícias de oito de Setembro desse ano relata o caso de uma cabra que após ter matado duas crias e mordido outras cabras, investiu “com verdadeira ferocidade” contra o dono que teve de a abater. Ainda nesse mês, sabe-se pela mesma fonte, foram abatidos quarenta e seis cães com sintomas desta doença, no conselho de Santa Cruz, sendo que dois eram da Camacha. Mas é do final de Outubro a notícia mais funesta, a qual nos dá conta do falecimento de uma criança, que tendo sido mordida por um cão em Agosto, veio a falecer nessa data. Fazendo o cruzamento com os registos paroquiais de óbito, o nome mais provável é de Manuel de Miranda, que terá falecido no dia vinte e três, com treze anos, filho de José de Miranda e Maria de Nóbrega, moradores nos Casais de Além. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) ABM – colecção de Jornais e Registos Paroquiais
MENDES, António Martins- Notas Históricas- A Raiva na Ilha da Madeira |
Autores Somos vários a explorar estes temas e por aqui iremos partilhar o fruto das nossas pesquisas. O que já falámos antes:
Abril 2024
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