História, histórias e curiosidades
Entre o final do mês de Março e inícios do mês de Abril, de 1934 a Madeira recebeu um grupo de finalistas do curso de direito, da Universidade de Lisboa. Durante quase duas semanas este grupo agitou a vida social madeirense que se desdobrou em eventos e recepções aos estudantes. Do vasto programa constaram chás, bailes, copo de água e um pic-nic com chá dançante, no primeiro dia de Abril, na Camacha, o qual, a exemplo de outras ocasiões, foi a única recepção fora do Funchal. A organização partiu da Academia do Funchal e o local escolhido foi o Hotel da Camacha. O Diário de Notícias, na sua edição de 5 de Abril assim o descreveu: “No magnífico Hotel da Camacha, onde já se encontrava a gentil «Madrinha» dos quintanistas, Mlle. Passiana Dias de Andrade e sua família, tiveram os excursionistas uma afectuosa recepção, dispersando-se pouco depois, em grupo pelos jardins, sempre num ambiente da mais franca cordealidade e confraternização. Alguns estudantes cantaram á viola e concertina diversas trovas ao desafio muitas das quais produziram grande hilariedade na assitencla devido ao fino espirito e á graça dos cantadores. Foi, depois, servido o chã e dôces em numerosas mesas artisticamente dispostas no jardim do Hotel, tendo algumas gentis meninas da nossa sociedade, coadjuvado os estudantes oferentes, na distribuição. O serviço, tanto o de chá, (fornecido pelo Hotel) como o de sandwlches e bôlos, (levados do Funchal pelos liceais) foi primoroso e abundante. Depois do chã, dançou-se animadamente no salão principal do Hotel.”[i] Apesar de ter sido um evento privado, não há-de ter passado despercebido entre a população local, não só pela exuberância dos excursionistas como também pelo facto de ser Domingo de Páscoa, cujas celebrações hão-de ter mantido as pessoas pelo centro, até porque, segundo o Diário de Notícias de 29 de Março de 1934, “Na freguesia da Camacha realizam-se este ano, pela primeira vez[ii], as cerimónias da Semana Santa. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] ABM Colecção de Jornais, Diário de Notícias.
[ii] A primeira vez após um interregno, eventualmente imposto pela implantação da República. Para informação complementar vede neste blogue Vivências Pascais
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Uma pequena nota inserida num bloco de “Noticiário Religioso” no Diário de Notícias de 31 de Agosto, de 1930, destacava um evento de elevado valor para a Camacha e até mesmo para a Madeira: “Na Camacha Naquela freguesia realiza hoje a solenidade do SS. Sacramento, com sermão ao Evangelho, música e lindas ornamentações no templo e arredores. Num dos salões do Hotel da Camacha, que acaba de passar por importantes melhoramentos, será hoje inaugurado um Cinema, que estreará fitas de magnífico efeito.” Atendendo ao nível de desenvolvimento na ilha, do início do século vinte, é de facto extraordinário que a Camacha, pequena aldeia serrana, tenha sido beneficiada com uma sala de cinema, muito provavelmente a única existente, na época, fora do Funchal. Uma outra notícia no mesmo jornal, cerca de um mês mais tarde, esmiúça um pouco mais o tema “Com a referida ampliação fica o belo hotel com cerca de cinquenta quartos, todos higiénicos e com muita luz e ar. Ao centro tem um vasto recinto para cinematografo, ao fundo do qual foi construído um pequeno, mas elegante palco para récitas de amadores… Foi um melhoramento importante que só a tenacidade do seu proprietário sr. Frederico Rodrigues conseguiu levar a efeito. Todo o hotel é iluminado a luz eléctrica.”[i] Não foi possível apurar quais “fitas” terão sido projectadas na inauguração, nem em posteriores sessões, eventualmente terão sido algumas das que, então, se exibiam nas salas do Funchal e que aqui se apresentam alguns títulos: O Club 73, O Hipócrita, O Amigo, O Cavalheiro Misterioso, Os milhões de Paulina, Os Filhos do Divórcio, A Noiva 68. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] Para informações complementares, vede neste blogue O hotel do sr. Frederico e Central eléctrica da Camacha
ABM – Diário de Notícias - Colecção de Jornais Foi na década de vinte, do século passado, que surgiu o aparelho de televisão nos Estados Unidos. No final de 1955 constituiu-se a Rádio Televisão Portuguesa e aos poucos os portugueses foram adquirindo aparelhos e rendendo-se a essa nova forma de entretenimento. Contrariamente ao que hoje sucede, em que as novas tecnologias e os inúmeros gadgets se propagam rapidamente, a generalização da televisão levou bastante tempo a ser alcançada, nomeadamente por questões de capacidade financeira para adquirir o aparelho. Na Madeira a este factor juntava-se o facto de que: quem adquiria uma televisão, dependia das condições meteorológicas para conseguir ver as emissões de Canárias, Marrocos e muito, muito raramente, a emissão de Portugal Continental, uma vez que a tecnologia de então requeria a instalação de um emissor capaz de garantir a difusão dos programas televisivos. Ainda assim, por meados dos anos sessenta já existiam bastantes televisores na Madeira e na Camacha diversos marcavam, também, já presença. Em Julho de 1971 iniciaram-se as obras necessárias para a implantação de uma delegação da RTP na Madeira e à Camacha coube receber o seu emissor e a torre retransmissora principal, que permitiriam aos madeirenses, finalmente, assistir diariamente a alguns programas de televisão. A 1111m de altitude, no Pico da Silva, ergueu-se uma torre metálica com 75m e um pequeno edifício para albergar o emissor. As obras demoraram mais que o previsto devido a condições climatéricas adversas. Em Junho de 1972 iniciaram-se os testes e a seis de Agosto do mesmo ano foi, oficialmente, inaugurada a Delegação da RTP na Madeira. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) ABM – Colecção de Jornais – Jornal da Madeira, Diário de Notícias
RTP 50 anos Televisor – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org) Aquando do povoamento a propriedade das terras foi definida pelas regras estabelecidas pela Coroa e foi tida em conta a condição social do candidato a povoador, bem como as características da área de cultivo. Foi, também, estabelecido um prazo de arroteamento das terras e a obrigação de estabelecer residência, sendo os solteiros obrigados a casar. Com o decorrer dos tempos e o aumento da população criou-se o sistema de colonia, em que o proprietário da terra cedia a sua exploração, com a obrigação do lavrador a tornar arável, de construir benfeitorias e de pagar essa utilização com de metade da produção. Essas primeiras terras foram se dividindo através de doação, troca ou venda e para garantir o seu justo valor foram nomeados Avaliadores. Também designados por Louvados e mais tarde Agrimensores, estes avaliadores não eram funcionários administrativos, nem tinham formação académica específica para tal, eram apenas pessoas idóneas a quem a sociedade local reconhecia capacidades para desempenhar eficazmente a incumbência. Abaixo se transcrevem: um relatório de uma avaliação efectuada em 1775 e uma lista de nomes de pessoas que exerceram o cargo, ambos referentes à Camacha, entre o final do século XVIII e meados do século XIX; “ Digo eu Miguel Martins avaliador ajuramentado pella Camera de Santa Cruz que eu fui chamado por Simão Vieira para avaliar as benfeitorias de hum bocado de fazenda cita ao Agoa d’ alto, no qual bocado de fazenda avaliei todas as benfeitorias, e o maes q’ adiante se dirá: Achei de vinha quatrocentas parreiras que achei valerem/ digo mais des parreiras/ três mil reis Maes hum milheiro de planta de inhame e o avaliei em mil reis Maes oitenta homens de parede a oitenta reis homem faz dezasseis mil reis Somao todas as benfeitorias salvo erro em 20$000 Avaliei maes na fazenda acima declarada um bocado de terra baldia, o qual não avaliei junto com a terra de vinha, e achei que vale 15 mil reis. Passa todo o referido na verdade e por não saber ler nem escrever pedi ao Re José de Freitas Spinola que este por mim fizese e comigo asginase Camacha oje 24 de Mço de 1775. Do avaliador Miguel Martins Re José de Freitas Spinola”[i] 1786 – António de Freitas; 1797 – António de Nóbrega; 1811– António Baptista; 1845 – José de Freitas Gonçalves e João Ferreira; 1847– José de Freitas Gonçalves e João Ferreira; 1851 –João Ferreira; 1853 - José de Freitas Gonçalves e João Ferreira; 1865 – José Correia, alvanéu morador em Igreja. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] ABM- Família Ornelas de Vasconcelos
ABM - Actas das Vereações da Câmara Municipal de Santa Cruz Vieira, Alberto Aprender Madeira- Colonia Almeida, Maria Antónia Pires de, Conceição Andrade Martins (2002), “Avaliador”, Conceição Andrade Martins, Nuno Gonçalo Monteiro (orgs.), A Agricultura: Dicionário das Ocupações, Nuno Luís Madureira (coord.), História do Trabalho e das Ocupações, vol. III, Oeiras, Celta Editora, pp. 290-291. ISBN: 972-774-133-9. Avaliador Em 1830 criou-se, nas freguesias, a Junta da Paróquia, com os deveres de administrar e conservar a igreja e os seus bens, cuidar das fontes, poços, pontes caminhos e baldios, saúde pública e ensino primário. Em 1835 a dita Junta adquiriu poderes de administração local, contudo pouco durou, dado em 1840 as Juntas da Paróquia terem sido excluídas da estrutura administrativa de então. Em 1867 recuperam a responsabilidade de gerir os interesses locais, mas só em 1878 é que ganharam o estatuto de poder executivo local mantendo, no entanto, a sua ligação à administração da igreja, aspecto que só iriam se dissociar aquando da implantação da república e passaram a se designar de Juntas de Paróquia Civil. Em 1916 passaram a se designar Juntas de Freguesia. Nem sempre aquilo que é criado e determinado em reformas administrativas é implementado como previsto e a Junta da Paróquia é um exemplo disso. Os tumultos populares, ocorridos em 1887, na sequência da tentativa do Governador Civil, João Câmara Leme Homem de Vasconcelos, fazer funcionar, sem sucesso, as Juntas da Paróquia na Madeira, são indiciadores de que, apesar dos nomes nomeados para as diferentes funções na Junta da Paróquia, nas secções de vereação da Câmara de Santa Cruz, na prática o seu papel na gestão da coisa pública na freguesia, provavelmente, não terá tido a abrangência que a lei previa. A revolta começou em Gaula em 23 Outubro, logo chegou à Camacha e teve o ponto crítico um mês mais tarde no Caniço, tendo a população amotinada invadido a igreja e destruído a casa paroquial. Houve violentos confrontos entre populares e as forças militares que causaram um número de feridos, não apurado, e a morte de quatro populares. António da Mota, natural da Camacha, foi atingido pelos disparos e ficou com os ossos maxilares destruídos, pelo que necessitou de internamento hospitalar e mereceu destaque de imprensa. De notar também que, a exemplo de outros cargos, por diversos períodos a Camacha perdeu, ao longo do século XIX, os seus representantes, ficando a cargo o Caniço a representação das duas freguesias. Abaixo apresenta-se a lista dos elementos da Junta da Paróquia que foi possível apurar: 1844 — João Ferreira do Pinheirinho e António Emídio de Sousa; 1846 – Manuel Silvério Baptista, José Teixeira das Neves; 1851 — António Emídio de Sousa (em comum com o Caniço); 1868– José Joaquim de Sá, Francisco de Gouveia e Nóbrega; 1869 – António Leandro de Vasconcelos e Miguel Luís Valério ( 1º professor oficial na Camacha); 1873 – José Joaquim de Sá, Francisco de Gouveia e Nóbrega; 1877 —Manuel Filipe Gomes, Januário Ferreira, Gregórios H. de Vasconcelos; 1887—José Joaquim Gonçalves, José de Miranda, Januário Luís Ferreira, Francisco António de Miranda, José João de Freitas Júnior. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) ABM Actas das Vereações da Câmara Municipal de Santa Cruz
ABM – Colecção de Jornais Vieira, Alberto Freguesias- Aprender Madeira Pauleta, Carlos Mendes Freguesias História e Actualidade1 |
Autores Somos vários a explorar estes temas e por aqui iremos partilhar o fruto das nossas pesquisas. O que já falámos antes:
Abril 2024
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