História, histórias e curiosidades
A atender apenas aos documentos, na imprensa madeirense, dir-se-ia que o Natal não se destacava na vida da Camacha, no Dezembro de 1973. O Café Relógio anunciava o seu famoso Frango na Púcara, Carlos Fotógrafo lembrava que tinha um atelier ao dispor dos camacheiros e a Escola Nuno Alvares recebia cento e cinquenta escudos, dádiva da comissão do «DIA MADEIRENSE» em New Bedford. A Festa da Conceição aconteceu, como sempre no dia oito, porém com a novidade de contar, pela primeira vez, com a animação de uma filarmónica camacheira, a Banda de S. Lourenço, nascida em Agosto de esse ano. Apesar da sua tenra idade, a Banda dava já nas vistas, tendo merecido um artigo na revista Madeira—73, intitulado «A Camacha e a sua Filarmónica mista». A Casa do Povo passou por um processo eleitoral, renovando os seus corpos sociais para o triénio seguinte, tendo sido eleitos para a Assembleia Geral: José de Góis, Presidente; António Sérgio Martins, 1º vogal e Adelino de Sousa, 2º vogal. Na Direcção os eleitos foram: Álvaro João de Nóbrega, Presidente; João de Gouveia Fernandes, vice-presidente; José Heliodoro Câmara, tesoureiro; Adelino de Sousa Barreto, secretário e José de Jesus Fernandes, vogal. Independentemente deste processo, a sua equipa de futebol participava no Campeonato Corporativo que englobava equipas de funcionários de Bancos, Caixa de Previdência, Sindicato de Empregados de Escritório, Sindicato de Indústria Hoteleira e sócios da Casa do Povo de Santo António. O seu Grupo Folclórico continuava a fazer brilhar a freguesia, desta feita apresentando-se para um grupo de visitantes luso brasileiros. No dia dezasseis “Terminou em Beleza o 4º campeonato de Hóquei-em-sapatilhas”[i]. Disputado até ao fim, e sempre com grande moldura humana a assistir, teve como 1ª classificada a equipa Águias, seguida de Angola, Primavera, Setúbal, Cova, Estrelas e Mercado. Com relação às estrelas no rinque, o rol de melhores goleadores ficou assim ordenado: José Manuel (Águias) 29; António João (Angola) 21; César (Águias) 21; Rui (Angola) 15; Rogério (Cova) 10; José João (Setúbal) 10; Gastão (Cova) 9; Laurentino (Setúbal) 9; Luciano (Primavera) 9; António Cardoso (Águias) 9; António Branco (Mercado) 8. No aspecto cultural a freguesia vivia um momento de alguma efervescência. O grupo de escoteiros[ii] promoveu um récita, em colaboração com outros jovens da Camacha, que decorreu no salão paroquial, nos dois primeiros domingos desse mês. Sempre com casa cheia, foram apresentados na primeira parte números de comédia, fados e desgarrada. “Os números cantados foram acompanhados por Marcelo em acordeão e Sabino com bateria, além dos fados e algumas canções, em que os próprios cantores tocaram as suas violas e guitarras”. Na segunda parte do espectáculo reinaram os The Pop Kings, sendo o novel agrupamento o verdadeiro responsável pela enchente da casa. O grupo “ formado totalmente por rapazes desta localidade: Egídio com viola-solo, Jorge Emanuel, viola-ritmo, Tiago, viola-baixo e Rogério Barreto, bateria. A sua actuação foi vivamente aplaudida pelos presentes, especialmente pelos numerosos jovens que cantaram em coro algumas canções apresentadas. Cada um dos elementos do conjunto canta bem , mas causou a maior surpresa e admiração, a voz magnífica do jovem Tiago, que elevou ao rubro o entusiasmo dos presentes. Este elemento substituiu o malogrado João Abel, falecido há tempos num desastre, e que foi um dos grandes impulsionadores deste conjunto musical.” Já sem a responsabilidade de todo o evento[iii], preparava-se, também por esses dias, a participação no Cortejo Etnográfico, integrado nas Festas de Fim de Ano, sendo a Camacha responsável pelos quadros alusivos de: charola, borracheiros, pastores, vimes, tear e romeiros, num total de quarenta e dois figurantes, que perfizeram cerca de um terço no total do cortejo. Contudo, nem todas eram boas notícias. A crise do petróleo que afectava o mundo desde Outubro[iv] desse ano, chegou em Dezembro à Camacha e no dia dezassete “dezenas de carros esperaram desde manhã cedo até tarde pelo precioso líquido combustível, desde o Valeparaíso até ao sítio dos Casais d'Além, onde se situa uma das bombas de gasolina desta localidade. Foi de facto um espectáculo inédito e que despertou a maior curiosidade e expectativa da população local.” Mais danoso foi ter chegado, também, à Camacha o surto de assaltos que afectava a Madeira. Na noite de dez para onze, a loja de Arnaldo de Araújo foi roubada. Partindo o vidro da montra, os meliantes levaram algumas dezenas de relógios de pulso, dezenas de anéis de ouro e cerca de cinquenta alianças e pulseiras de ouro, num valor estimado de cem mil escudos. De entre os trinta e seis assaltos, de que havia queixa, este perpetrado na Camacha foi o mais avultado e o que, de certa forma, proporcionou à polícia encontrar o fio à meada e deslindar o caso tendo, apenas seis dias depois, apresentado à justiça os responsáveis, tanto pelos assaltos como pela recepção dos artigos roubados. Nenhum dos criminosos era camacheiro nem aqui residente. Eventualmente, poderá não ter sido o mês de Dezembro mais preenchido em eventos, concernentes à Camacha, contudo o de 1973 destaca-se pela profusão de testemunhos, registados na imprensa da época, e que constituem uma rica fonte de informação que nos permite criar uma imagem mais nítida da vida na localidade. Com um grato e especial reconhecimento, às crónicas da época, do correspondente da Camacha no Jornal da Madeira, Filipe Mota. Fernanda Nóbrega @ CAMACHA - camacha (weebly.com) [i] Notícias da Camacha por Filipe Mota, no Jornal da Madeira – ABM Colecção de Jornais
[ii] Segundo informação recolhida no site da Paróquia da Camacha, este agrupamento de escoteiros foi efémero, tendo terminado com o 25 de Abril de 1974 e nunca ter chegado a integrar o Corpo Nacional de Escoteiros. [iii] Vede neste blogue Quando a Camacha foi à Cidade [iv] Crise petrolífera de 1973 – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org) ABM – Colecção de Jornais * Camacha de outros tempos - A foto publicada no grupo do Facebook está identificada com a data de 1972, no entanto a notícia no Jornal da Madeira coloca-a em 1973
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Abril 2024
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